"Aplanar Montes, abater colinas, encher vales..."

Domingo II do Advento (C)
1ª Leitura - Do Livro de Baruc
Jerusalém, tira as vestes de luto e de aflição; reveste-te para sempre dos adornos da glória que te vem de Deus. Cobre-te com o manto da justiça que vem de Deus, e põe sobre a tua cabeça o diadema da glória do Eterno, porque Deus vai mostrar o teu esplendor a todos os que vivem debaixo do céu. Eis o nome que Deus te dará para sempre: ‘Paz da Justiça e Glória da Piedade!’ Levanta-te, ó Jerusalém, põe-te no alto e olha para o Oriente! Contempla os teus filhos reunidos desde o nascente ao poente pela voz do Santo, invocando alegremente a Deus. Quando partiram iam a pé, levados pelo inimigo. Deus, porém, fá-los voltar para ti, em triunfo, como em cortejo real. Deus mandou rebaixar todos os altos montes e colinas elevadas, e encher os vales até aplanar a terra, a fim de que Israel caminhe com segurança, guiado pela glória de Deus. Os bosques e todas as árvores aromáticas darão sombra a Israel, por ordem do Senhor. Na verdade, o próprio Deus conduzirá Israel, com júbilo, à luz da sua majestade, com a justiça e a misericórdia que dele procedem.»
2ª Leitura - Da 1ª Carta aos Filipenses 
«Sempre, em toda a minha oração por todos vós. É uma oração que faço com alegria, por causa da vossa participação no anúncio do Evangelho, desde o primeiro dia até agora. E é exactamente nisto que ponho a minha confiança: aquele que em vós deu início a uma boa obra há-de levá-la ao fim, até ao dia de Cristo Jesus. Pois Deus é minha testemunha de quanto anseio por todos vós, com a afeição de Cristo Jesus. E é por isto que eu rezo: para que o vosso amor aumente ainda mais e mais em sabedoria e toda a espécie de discernimento, para vos poderdes decidir pelo que mais convém, e assim sejais puros e irrepreensíveis para o dia de Cristo, repletos do fruto da justiça, daquele que vem por Jesus Cristo, para glória e louvor de Deus.»
3ª Leitura - Do Evangelho de Lucas
No décimo quinto ano do reinado do imperador Tibério, quando Pôncio Pilatos era governador da Judeia, Herodes, tetrarca da Galileia, seu irmão Filipe, tetrarca da Itureia e da Traconítide, e Lisânias, tetrarca de Abilena, sob o pontificado de Anás e Caifás, a palavra de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto. Começou a percorrer toda a região do Jordão, pregando um baptismo de penitência para remissão dos pecados, como está escrito no livro dos oráculos do profeta Isaías:«Uma voz clama no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor e endireitai as suas veredas. Toda a ravina será preenchida, todo o monte e colina serão abatidos; os caminhos tortuosos ficarão direitos e os escabrosos tornar-se-ão planos. E toda a criatura verá a salvação de Deus.’»
 
Comentário às Leituras
"Aplanar montes, abater colinas, encher vales..."
I. No fim do exílio na Babilónia, o Profeta Baruc imagina a cidade de Jerusalém como uma mulher viúva envelhecida pela solidão que vive dobrada sobre as suas próprias resignações e aflições desde que viu os seus filhos serem também levados para o cativeiro. Agora – diz o Profeta – é altura de deitar fora ao trapos negros da viuvez, levantar-se e trazer de novo ao rosto a alegria. O fim do cativeiro está próximo e o regresso do povo deve ser um acontecimento cheio de Esperança e Alegria, para que seja possível reconstruir Jerusalém que vão reencontrar como um montão de ruínas nas quais há muito já crescem silvas…
O Profeta inspira esta esperança no Povo e esta alegria na figura da viúva reerguida que se transfigura numa mulher livre dos mantos da viuvez, que sobe ao monte mais elevado e de lá rejubila com a chegada dos filhos dispersos, sendo a sua própria Esperança e Alegria rejuvenescida um farol para o Povo a Caminho.
Podíamos hoje olhar para nós como Igreja de Jesus… Que rosto temos? Como nos veria o Profeta Baruc? Seríamos como uma viúva curvada sobre as suas próprias coisas, remoendo as suas próprias histórias, resignações e ruínas, ou seríamos antes a mulher livre dos trapos velhos da viuvez, sem pesos do passado, capaz de subir a montes elevados para que a sua Esperança e Alegria fossem inspiração e provocação evangélica para todos os que Caminham?...
A verdade é que temos sempre um pouco das duas, não é?! Por isso temos que continuar a abrir-nos à Novidade do Espírito de Deus que “aplana os altos montes” das nossos orgulhos e preconceitos, “abate as colinas seculares” das nossas verdades-de-cartilha, certezas moralistas e piedades inconsequentes, “enche os vales profundos” das nossas procuras, das nossas pobrezas, das nossas dificuldades em viver de maneira conforme ao que rezamos quando dizemos “Venha o Teu Reino”…
II. Ao longo de toda a história do Povo de Deus, antes e depois de Jesus, nunca deixaram de haver Profetas que assumem a missão de colaborar com o Espírito de Deus nesta tarefa de “aplanar montes, abater colinas seculares e encher vales” de modo a “preparar o Caminho do Senhor”… João Baptista tem uma importância singular nesta história profética por ser de todos os do Antigo Testamento o único que conviveu com aquele que esperava. Ele é a síntese de toda a profecia da Antiga Aliança, ele é a “voz” de todo o Antigo Testamento.
O evangelho de hoje começa com uma descrição minuciosa do contexto político em que começou a acontecer a Nova Aliança: dá-nos as datas e os nomes do imperador de Roma, do governador romano na Judeia e dos responsáveis pelas diversas regiões. Podemos perguntar ao evangelista: “O que é que isso nos interessa?” E ele responder-nos-á que nós muitas vezes “desencarnámos” a Boa Notícia da Salvação que Deus sonhou “encarnar” em Jesus, o Cristo, como o inaugurador de uma Nova Humanidade!
É importante compreendermos que a Nova Aliança foi inaugurada num tempo histórico concreto, com lugares, pessoas e datas bem precisas. O anúncio de Jesus, o Cristo, não pode cair num vazio teórico, uma “fé” desencarnada que não conhece nem ama o seu mundo, nem dialoga com ele! A “fé” da Nova Aliança não pode confundir-se com um “espiritualismo individualista”.
A Fé Cristã é uma permanente emergência pessoal
em contexto de pertença comunitária
aos “dois ou mais reunidos em Nome de Jesus”
para acolher a Palavra e abrir-se á vitalidade do Espírito
e, deste modo, continuar na História
a dinâmica do Advento do Reino de Deus
que em Jesus se inaugura e no Espírito se plenifica!
III. Para nos mantermos fiéis a esta Vocação-Missão é que Paulo diz hoje a esta Igreja que somos nós o mesmo que dizia à Igreja dos Filipenses: “peço a alegria para todos vós que vos empenhais na causa do Evangelho [ajuda-nos, Senhor!]… Aquele que em vós começou tão boa obra, há-de levá-la a bom termo… Que o vosso Amor cresça cada vez mais em Sabedoria e Discernimento para serdes capazes de escolher sempre o melhor… Procurai a Justiça e os seus frutos, que se conseguem em Jesus Cristo, para louvor e glória de Deus…

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