A Novidade de um Messianismo Não-Violento...

Domingo XXIX do Tempo Comum (B)
1ª Leitura - Do Livro de Isaías
Mas aprouve ao Senhor esmagá-lo com sofrimento, para que a sua vida fosse um sacrifício de reparação. Terá uma posteridade duradoura e viverá longos dias, e o desígnio do Senhor realizar-se-á por meio dele. Por causa dos trabalhos da sua vida verá a luz. O meu servo ficará satisfeito com a experiência que teve. Ele, o justo, justificará a muitos, porque carregou com o crime deles.
2ª Leitura - Da Carta aos Hebreus
Uma vez que temos um grande Sumo Sacerdote que atravessou os céus, Jesus, o Filho de Deus, conservemos firme a fé que professamos. De facto, não temos um Sumo Sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, pois Ele foi provado em tudo como nós, excepto no pecado. Aproximemo-nos, então, com grande confiança, do trono da graça, a fim de alcançar misericórdia e encontrar graça para uma ajuda oportuna.
3ª Leitura - Do Evangelho de Marcos
Tiago e João, filhos de Zebedeu, aproximaram-se dele e disseram: «Mestre, queremos que nos faças o que te pedimos.» Disse-lhes: «Que quereis que vos faça?» Eles disseram: «Concede-nos que, na tua glória, nos sentemos um à tua direita e outro à tua esquerda.» Jesus respondeu: «Não sabeis o que pedis. Podeis beber o cálice que Eu bebo e receber o baptismo com que Eu sou baptizado?» Eles disseram: «Podemos, sim.» Jesus disse-lhes: «Bebereis o cálice que Eu bebo e sereis baptizados com o baptismo com que Eu sou baptizado; mas o sentar-se à minha direita ou à minha esquerda não pertence a mim concedê-lo: é daqueles para quem está reservado.» Os outros dez, tendo ouvido isto, começaram a indignar-se contra Tiago e João. Jesus chamou-os e disse-lhes: «Sabeis como aqueles que são considerados governantes das nações fazem sentir a sua autoridade sobre elas, e como os grandes exercem o seu poder. Não deve ser assim entre vós. Quem quiser ser grande entre vós, faça-se vosso servo e quem quiser ser o primeiro entre vós, faça-se o servo de todos. Pois também o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por todos.»
 
Comentário às Leituras
A Novidade de um Messianismo Não-Violento
 
I. Os capítulos 40 a 55 do livro do Profeta Isaías foram escritos enquanto o Povo de Israel estava exilado na Babilónia. São um apelo permanente à Esperança e à Resistência Fiel como atitudes que preparam a Liberdade que está para chegar…
Surge neste contexto a figura do “Servo Fiel de Iahvé” (“Iahvé” é "Deus" em hebraico, língua do Antigo Testamento) ou “Servo Sofredor”. Bem dito, é mesmo assim: o “Servo Sofredor de Iahvé por causa de ser Fiel”! Representa o Resto Fiel do Povo de Israel que não abandonara as promessas de Deus a Israel e a Sua Aliança que viviam pelo cumprimento da Lei de Moisés. Por se manterem fiéis a tudo isto, sofriam represálias, perseguições e torturas por parte dos babilónicos. Aqueles que esqueciam a fidelidade aos costumes do Povo de Deus e se adaptavam aos costumes religiosos da Babilónia, facilmente viviam contentes e tranquilos.
Os textos do “Servo Fiel de Iahvé” são o anúncio apaixonado aos judeus que estavam a sofrer de que a sua Fidelidade havia de abrir caminho à acção libertadora de Deus. Ainda que, durante o exílio, a Fidelidade implicasse sofrimento, não se podia desistir porque a Verdade e a Justiça acabam sempre por derrotar a mentira e a opressão.
Foi este anúncio libertador de resistência não-violenta que, de facto, preparou o Resto Fiel do Povo a trilhar o caminho da liberdade em direcção à sua Terra poucos anos depois.
Além deste anúncio de Esperança e Resistência Fiel, a profecia do “Servo Fiel Sofredor” diz-nos também que no tempo em que o Povo ficou sem o Templo de Jerusalém é que descobriu verdadeiramente o “culto que agrada a Deus”: ser Fiel à Sua Vontade!
Numa linguagem às vezes muito “crua” para a nossa cultura, essas profecias dizem-nos que Deus não precisa de animais sacrificados e oferecidos em holocausto em templo nenhum, mas sim do “sacrifício e da oferta dos Seus próprios servos fiéis”, linguagem simbólica da Fidelidade. É a Fidelidade à Palavra de Deus e o Compromisso com a Sua Causa de Libertação dos oprimidos o único “culto” que Deus procura dos Seus, e não ritos vazios e cerimónias sem Vida.
II. O evangelho de hoje fala-nos da incompreensão sobre o messianismo de Jesus por parte dos seus discípulos. Jesus, que tantas vezes se identificara com o Resto Fiel na linguagem dos profetas antigos, que tantas vezes lhes falara já do Servo Fiel disposto a sofrer e a resistir não-violentamente até à morte se fosse preciso pela Causa do Reino de Deus, é mais uma vez confrontado pela mentalidade judaica dos seus!
Continuavam à espera que Jesus fosse o realizador das suas próprias ideias de Messias, da linhagem do glorioso Rei David, que iria formar um exército de puros para destruir todos os pecadores dentre o seu Povo e expulsar os pagãos. Entendiam o Reino de Deus como um Reino político e não com uma “Nova Ordem do Mundo”, uma renovada maneira de ser Homem em permanente construção e cuja plenitude definitiva é a Comunhão Humano-Divina do Céu!
Por esperarem ainda um Reino assim foram os dois irmãos pedir a Jesus os primeiros lugares de importância nesse Reino… “Não sabeis o que estais a pedir!”, disse Jesus. Eles continuaram a não entender, e Jesus falou-lhes do Cálice, que é símbolo bíblico da entrega da própria Vida, e do Trono que é uma linguagem do Novo Testamento para falar da Vitória da Ressurreição.
A instauração do Reino de Deus acontece na Morte-Ressurreição de Jesus, pelo dom do Espírito Santo. A Morte pecaminosa de Jesus (cálice) é a proclamação de que o Caminho do Poder acaba sempre por conduzir à injustiça, ao fratricídio e ao fracasso humano. A Ressurreição de Jesus (trono) é a proclamação de que o Caminho do Evangelho do Amor e dos Não-Violentos acaba sempre por conduzir à vitória da Vida, porque Deus toma partido!
“Os outros dez ficaram zangados com os dois irmãos”… porque esperavam todos o mesmo!!! O desejo do domínio e do poder gera a divisão. Por isso Jesus diz “aos outros dez”, que somos todos nós, que a Fidelidade ao seu Evangelho implica vivermos “na contra-corrente” dos critérios do mundo, assumindo a disponibilidade para o Serviço e para a Partilha como segredo certo para que o mundo se transforme cada vez mais em Reino de Deus, que era como Jesus chamava à construção da fraternidade, à derrota de todas as fronteiras de preconceitos e à vitória da comunhão humana sobre o egoísmo.
Que a Novidade Messiânica, tão difícil de acolher por parte dos primeiros discípulos de Jesus, seja para os discípulos de hoje motivo de júbilo e compromisso renovado com a Causa do Reino de Deus!
III. O pedaço da Carta aos Hebreus que escutamos na segunda leitura olha para Jesus à luz das profecias do “Servo Fiel e Sofredor” do Antigo Testamento, dizendo que o Caminho Messiânico de Jesus passou pelo sofrimento e pela injustiça que nós também muitas vezes experimentamos. Isso deve encher-nos de confiança porque sabemos que, afinal, somos discípulos de um Ressuscitado, somos seguidores de um Vitorioso!
Na Morte de Jesus revela-se a sua máxima Fidelidade; na sua Ressurreição revela-se a máxima Fidelidade de Deus! O que agradou a Deus não foi “aquela” Morte, porque Deus não Se agrada do pecado, mas sim aquela Fidelidade, porque esta é sempre gerada pelo Amor.

1 comentário:

Anónimo disse...

Obrigado por Blog intiresny