Messias, sim! Mas não esse, Pedro...

Domingo XXIV do Tempo Comum (B)
1ª Leitura - Do Livro de Isaías
O Senhor Deus abriu-me os ouvidos, e eu não resisti, nem recusei. Aos que me batiam apresentei as espáduas, e a face aos que me arrancavam a barba; não desviei o meu rosto dos que me ultrajavam e cuspiam. Mas o Senhor Deus veio em meu auxílio; por isso não sentia os ultrajes. Endureci o meu rosto como uma pedra, pois sabia que não ficaria envergonhado. O meu defensor está junto de mim. Quem ousará levantar-me um processo? Compareçamos juntos diante do juiz! Apresente-se quem tiver qualquer coisa contra mim. O Senhor Deus vem em meu auxílio; quem ousará condenar-me? Cairão todos esfrangalhados, como roupa velha, roída pela traça.
2ª Leitura - Da Carta de Tiago
De que aproveita, irmãos, que alguém diga que tem fé, se não tiver obras de fé? Acaso essa fé poderá salvá-lo? Se um irmão ou uma irmã estiverem nus e precisarem de alimento quotidiano, e um de vós lhes disser: «Ide em paz, tratai de vos aquecer e de matar a fome», mas não lhes dais o que é necessário ao corpo, de que lhes aproveitará? Assim também a fé: se ela não tiver obras, está completamente morta. Mais ainda: poderá alguém alegar sensatamente: «Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me então a tua fé sem obras, que eu, pelas minhas obras, te mostrarei a minha fé».
3ª Leitura - Do Evangelho de Marcos
Jesus partiu com os discípulos para as aldeias de Cesareia de Filipe. No caminho, fez aos discípulos esta pergunta: «Quem dizem os homens que Eu sou?» Disseram-lhe: «João Baptista; outros, Elias; e outros, que és um dos profetas.» «E vós, quem dizeis que Eu sou?» - perguntou-lhes. Pedro tomou a palavra, e disse: «Tu és o Messias.» Ordenou-lhes, então, que não dissessem isto a ninguém.
Começou, depois, a ensinar-lhes que o Filho do Homem tinha de sofrer muito e ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e pelos doutores da Lei, e ser morto e ressuscitar depois de três dias. E dizia claramente estas coisas.
Pedro, desviando-se com Ele um pouco, começou a repreendê-lo.
Mas Jesus, voltando-se e olhando para os discípulos, repreendeu Pedro, dizendo-lhe: «Vai-te da minha frente, Satanás, porque os teus pensamentos não são os de Deus, mas os dos homens.»
Chamando a si a multidão, juntamente com os discípulos, disse-lhes: «Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. Na verdade, quem quiser salvar a sua vida, há-de perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, há-de salvá-la.
 
Comentário às Leituras
"Messias", sim! Mas não esse, Pedro...
I. Muitas vezes o Povo de Israel confundiu o Poder Libertador de Deus com a força opressora ao jeito do mundo, a Palavra de Aliança de Deus com as leis e imposições ao jeito dos Homens poderosos, a Adoração “em Espírito e em Verdade” com o culto vazio e idolátrico das religiões pagãs…
Confundiu-se o Povo de Israel, e também se confundiu e confunde ainda muitas vezes o Novo Povo de Deus, a Igreja! Por isso, é fundamental o papel dos profetas como arautos da Verdade e da Liberdade de Deus, sempre ao contrário das lógicas opressoras do mundo.
É isso mesmo que proclama o profeta Isaías com esta linguagem do “Servo Sofredor de Deus”. Diante da opressão e da violência, o profeta proclama que a única resposta digna de um servo de Deus é a perseverança fiel.
Os profetas viram sempre as lógicas do mundo ao contrário, porque falam com Deus na boca! As vitórias de Deus na história decidem-se na fidelidade incondicional dos Seus Profetas, e nunca no domínio ou na violência “em Seu Nome”.
Na Igreja primitiva, os Apóstolos leram a fidelidade sem limites de Jesus à luz destes textos do “Servo Sofredor” de Isaías. Com efeito, também Jesus enfrentou cara-a-cara a infidelidade opressora dos poderosos do seu povo lutando unicamente com as armas da Palavra da Verdade a da Justiça, e fortalecido por uma Confiança incondicional no Poder Libertador do seu Abba.
II. No diálogo deste pedaço do evangelho de Marcos está o drama entre dois tipos de messianismo. Jesus perguntou aos Apóstolos sobre os “boatos” que corriam acerca dele… Toda a gente reconhecia em Jesus um continuador fiel dos profetas antigos. No entanto, Jesus cala-os para lhes fazer a pergunta fundamental da Fé: “E vós?! Face-a-face comigo, quem dizeis que eu sou?! Quem sou eu para vós?”
Pedro respondeu: “És o Messias!”
A resposta parece boa… Mas que tipo de Messias é que Pedro tinha na cabeça?...
Como quase todos os judeus, esperava um Messias da descendência do grande Rei David que conquistara e unificara o território de Israel pela sua força e poderio militar, cerca de mil anos antes. O Messias era esperado com características davídicas e viria purificar o seu povo de todo o pecado e impureza, em Nome de Deus. Como? Aniquilando os pecadores e destruindo todos os impuros!
No entanto, Jesus não se sente minimamente “atraído” por esse tipo de messianismo… Sente-se chamado a “anunciar uma Boa Notícia aos pobres e marginalizados, libertar os oprimidos e anunciar o tempo da Bondade Gratuita (Graça) de Deus!” (Lc 4, 18)
Em vez de querer formar o exército messiânico, Jesus está disposto a morrer pelo anúncio de um Reino de Deus assim! Em nome da libertação dos oprimidos pela força do Espírito Santo e em nome da Bondade Gratuita (Graça) de Deus, está disposto a morrer!
Pedro não aceita… Chama Jesus à parte e começa a repreendê-lo!!! Não era suposto o Messias ser assim…
“Saiu” muito Inesperado, o tão Esperado Messias de Israel… Não era suposto Deus ser tão Surpreendente na realização das Suas Promessas e na revelação dos Seus Dons!
Jesus chamou a Pedro “causador de divisão” (em hebraico: sathan; não é nenhum “senhorzinho mau com corninhos e rabinho” mas uma atitude de ruptura com a vontade de Deus e o bem do Homem) porque estava na lógica errada: “não compreendes as coisas segundo Deus mas apenas segundo os Homens!”
Depois, explica as verdadeiras atitudes do Discípulo:
“Renunciar a si mesmo” significa mudar de lógica: das lógicas do mundo que passam sempre pela opressão e pelo domínio à lógica do Espírito que é da Verdade e da Insurreição não violenta).
“Tomar a cruz” significa estar disposto a aceitar todas as consequências que acarretam as iniciativas proféticas, na certeza de que “o Amor é mais forte que a morte”.
“Seguir Jesus” significa não querer inventar outras maneiras nem outras lógicas para instaurar o Reino de Deus na história senão a luta evangélica segundo as Bem-Aventuranças!
III. Seguir Jesus significa também viver uma experiência de Fé consequente, “com obras” como diz a carta de Tiago. “A Fé sem obras-acções está morta”. Dizia Jesus: “A árvore conhece-se pelos seus frutos!” É pelas acções e iniciativas do Coração que dás provas da tua Fé…

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