Deus não se deixa vencer em Generosidade...

Domingo XXXII do Tempo Comum (B)
1ª Leitura - Do 1º Livro dos Reis
Elias levantou-se e foi para Sarepta; ao chegar à entrada da cidade, eis que havia lá uma mulher viúva que andava a apanhar lenha; chamou-a e disse-lhe: «Vai-me arranjar, te peço, um pouco de água numa vasilha, para eu beber.» Ela foi buscar a água e Elias chamou-a e disse-lhe: «Traz-me também um pedaço de pão nas tuas mãos.» Então ela respondeu: «Pela vida do Senhor, teu Deus, não tenho pão cozido; tenho apenas um punhado de farinha na panela e um pouco de azeite na ânfora; mal tenha reunido um pouco de lenha entrarei em casa para preparar esse resto para mim e para meu filho; vamos comê-lo e depois morreremos.» Elias disse-lhe: «Não tenhas medo; vai a casa e faz como disseste. Disso que tens faz-me um pãozinho e traz-mo; depois é que prepararás o resto para ti e para o teu filho. Porque assim fala o Senhor, Deus de Israel: ‘A panela da farinha não se esgotará, nem faltará o azeite na almotolia até ao dia em que o Senhor mandar chuva sobre a face da terra.’» Ela foi e fez como lhe dissera Elias: comeu ele, ela e a sua família, durante alguns dias. Nem a farinha se acabou na panela, nem o azeite faltou na almotolia, conforme dissera o Senhor pela boca de Elias.
2ª Leitura - Da Carta aos Hebreus
Na realidade, Cristo não entrou num santuário feito por mão humana, figura do verdadeiro santuário, mas entrou no próprio céu, para se apresentar agora diante de Deus em nosso favor. E nem entrou para se oferecer a si mesmo muitas vezes, tal como o Sumo Sacerdote, que entra cada ano no santuário com sangue alheio; nesse caso, deveria ter sofrido muitas vezes desde a fundação do mundo. Agora, porém, na plenitude dos tempos, apareceu uma só vez para destruir o pecado pelo sacrifício de si mesmo. E, assim como está determinado que os homens morram uma só vez e depois tenha lugar o julgamento, assim também Cristo, que se ofereceu uma só vez para tirar os pecados de muitos, aparecerá uma segunda vez, não já por causa do pecado, mas para dar a salvação àqueles que o esperam.
3ª Leitura - Do Evangelho de Marcos
Continuando o seu ensinamento, Jesus dizia: «Tomai cuidado com os doutores da Lei, que gostam de exibir longas vestes, de ser cumprimentados nas praças, de ocupar os primeiros lugares nas sinagogas e nos banquetes; eles devoram as casas das viúvas a pretexto de longas orações. Esses receberão uma sentença mais severa.» Estando sentado em frente do tesouro, observava como a multidão deitava moedas. Muitos ricos deitavam muitas. Mas veio uma viúva pobre e deitou duas moedinhas, uns tostões. Chamando os discípulos, disse: «Em verdade vos digo que esta viúva pobre deitou no tesouro mais do que todos os outros; porque todos deitaram do que lhes sobrava, mas ela, da sua penúria, deitou tudo quanto possuía, todo o seu sustento.»
 
Comentário às Leituras
Deus não se deixa vencer em Generosidade...
 
I. O início da missão profética de Elias acontece no reinado do Rei Acab, considerado pelos judeus um dos piores reis da sua história. Casou-se com Jezabel, uma pagã, que levou para Israel todas as divindades e práticas idolátricas do seu povo. Acab foi o rei “casado com a idolatria”.
É sempre nestes contextos que o Resto Fiel do Povo de Deus “dá à luz” os profetas como arautos da Fidelidade à Aliança com Deus.
O profeta assume normalmente uma missão solitária, porque quase ninguém quer viver “contra a corrente” dos que detêm o poder. Por isso, esses “treinados na escuta da Palavra e no seu anúncio” são sempre Homens de uma profunda Confiança em Deus. Firmam-se na Sua Generosidade e afirmam-se na Sua Fidelidade.
Logo no início da sua missão, vemos que Elias é obrigado a fugir e vai para junto da torrente de Karit. Diz o Primeiro Livro dos Reis que aí bebia da água da torrente e pela manhã e pela tarde Deus dava-lhe pão e carne levada pelos corvos. Tudo isto é linguagem simbólica da Graça e da Generosidade de Deus que não desilude os que nele confiam.
Entretanto, a torrente secou. Então, Deus envia Elias a uma cidade pagã, Sarepta, e lá continuará a receber os Seus dons. Numa cidade pagã?! O Espírito de Deus é Livre e inspira todo aquele que estiver disponível para a Verdade e a Bondade.
O dom de Deus revelou-se a Elias numa viúva paupérrima que preparava a última refeição com o seu filho antes de morrerem à fome. Pagã e paupérrima (!!!) eis a mulher na qual Deus revela a Sua Graça e Generosidade.
Deus não deixa de surpreender Elias…
A viúva foi capaz de confiar, arriscar e partilhar. Uma pagã foi capaz da atitude de Coração que os judeus já tinham desaprendido…
Na generosidade da viúva mantém-se inalterável para Elias a Generosidade de Deus. E, além disso, porque Deus não Se deixa vencer em generosidade, Elias promete à mulher: “Não mais acabará a farinha na tua panela, nem o azeite na tua almotolia”. A Confiança e a Partilha são o segredo da Abundância.
II. É para esta Boa Nova que aponta também o Evangelho de hoje, na figura da viúva que deitou duas moedas no cofre do templo. O órfão e a viúva são os dois símbolos bíblicos do abandono e da pobreza. As escutarmos as palavras de Jesus em relação à oferta da viúva, devemos ter como pano de fundo o que Deus havia dito já ao profeta Samuel: “Não te iludas com o modo como vês, porque o Homem só vê as aparências, mas Deus vê o Coração…” (1Sam 16, 7)
Por baixo do gesto da viúva está a Sabedoria fundamental de que a generosidade inspirada pelo Espírito tem a ver sempre com a Verdade, e a máxima manifestação da generosidade não é dar, mas dar-se! Essa era a Sabedoria e a Verdade que os Doutores da Lei não conheciam, ainda que fossem ricos e dessem muito para o cofre do Templo (do qual eles próprios gozavam depois, e não os pobres…).
As acusações duras que Jesus lhes faz antes são disso um sinal claro. Condena-lhes a Vaidade e a sobranceria que manifestavam com as suas longas túnicas e com a disputa dos primeiros lugares para tudo (excepto para o serviço…). Adoravam ser os “importantóides” saudados por todos na rua…
S. Paulo diz na Carta aos Colossenses (3, 5) que “a Vaidade é uma espécie de idolatria”, e essa gente “importantóide” que quer ser “alguém” à custa do Nome de Deus está, de facto, muito longe do Deus dos escravos, dos pobres, dos órfãos, das viúvas e dos pagãos de que nos fala a Escritura. Fizeram de Deus um ídolo à medida das suas próprias necessidades, uma sombra dos seus próprios sonhos de poder, prestígio e domínio!
Por isso estão longe da Generosidade de Deus e da generosidade dos Seus. Pelo contrário, exploram os mais fracos e indefesos. São como “pastores” que engordam á custa do seu próprio rebanho! Arrombam a porta sagrada da consciência das pessoas simples e tocam nas suas feridas, remexem com os seus medos… Depois, “com pretextos de longas orações e consolo piedoso, devoram os bens das viúvas” e das outras pessoas simples e pobres que a eles se confiam.
Malditos os servos desse ídolo que roubou o Nome de Deus! Porque muito pior que “usar o Nome de Deus em vão” é usá-lo para explorar e diminuir aqueles que Deus ama!
III. Este final do capítulo 9 da Carta aos Hebreus é como que um resumo de tudo o que foi dito anteriormente. Em linguagem que é para nós algo enigmática (foi escrita “aos Hebreus” e não aos Ocidentais contemporâneos!) repete a ideia de Jesus Cristo como Único Mediador entre Deus e os Homens (Sumo Sacerdote), Único e Eterno porque está ressuscitado junto de Deus.
Assim, já não precisamos de continuar o culto da Antiga Aliança feito por inúmeros sacerdotes, vítimas e sacrifícios, mas vivemos o “Culto da Nova Aliança” que é fazer a Vontade de Deus (Heb 10, 9) e libertar-se da escravidão do pecado.
Este é o Caminho da Esperança em Cristo, essa é a certeza do Reino Definitivo de Deus aberto para nós por Jesus Cristo Ressuscitado e não pelos cultos sacrificiais segundo a Lei…

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